terça-feira, fevereiro 21, 2017
Vi o amor em éssipê
Já disse o Criolo: Não existe amor em SP
Não me leve a mal, seu moço
Mas existe sim e aqui lhe faço crer
Amor em SP não é dos mais escancarados
Nem exibido, nem de muitos beijos e abraços
É amor truncado, teimoso e meio brabo
Um tanto apressado e de passo firme
Oras é meio cinza, oras lindamente colorido
Ora engravatado, ora semi-nu carnavalesco
É amor que rasga asfalto
Brota de parede
Salta pela janela do prédio
Corre que lá vem o metrô
Amor nordestino, oriental, africano
E de tantos outros
É tudo amor paulistano
Às vezes mora num caríssimo apê
Às vezes tá ali sentado na calçada e você nem vê
É um amor meio faminto
Que por vezes pede esmola
Ou mesmo pouco frequenta a escola
Tem paciência, seu moço
É amor que requer cuidado
Amor que precisa de fino trato
Educação, moradia, transporte e trabalho
Mas posso lhe garantir
Sobre o que vi em SP
Tem muito amor nesse rolê.
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PS: Fevereiro, 2017; após 10 dias em São Paulo.
quarta-feira, fevereiro 08, 2017
segunda-feira, janeiro 30, 2017
Banho negro
No banho
Queria a pele limpar
Apagar aquela cor suja
Esfregava com força para branca ficar.
Doía.
Doía muito.
E doída seguia.
A cada dia. A cada banho.
A dor sob o chuveiro não era maior
Que a que sentia por dentro.
Cada olhar. Cada piada. Cada insulto.
Sujavam sua alma com o mais imundo racismo.
Voltava para casa querendo ir embora.
Daquele lugar. Daquele mundo. Daquela cor.
Ela não tinha culpa.
Por que eu?
Por que eu?
Por que eu?
Todo dia. Todo banho.
A mesma dor.
Toda doída.
Pequena
Sob a água
Chorava sem lágrimas.
Hoje.
Grande.
Ainda chora. Ainda seca.
Mas também grita. Resiste. Luta.
E durante o banho não mais se esfrega.
Sob o cantar das águas do chuveiro
Ela dança consigo mesma.
Se acaricia. Se encobre. Se sente.
Acarinhando a própria pele
Que um dia foi maltratada.
Julgada mal lavada.
Mal amada.
(Banho negro, Gislene Ramos)
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